terça-feira, 15 de maio de 2012

OS DISCÍPULOS URBANOS DE ENTÃO E DE AGORA


Acabo de ler um trabalho monográfico que foi entregue por James H. Park a Dr. Wilbert R. Shenk, como um requisito da Escola de Missão Mundial, para aquisição do título de Ph.D. no seminário teológico Fuller. E quero compartilhá-lo com você.

Para ser um trabalho de nível tão erudito, eu criticaria a freqüência acentuada com que James H. Parker usa metáforas e outras figuras de linguagem. “Galhos balançados pelas últimas brisas”, “Remendos novos em panos velhos”, “armazéns” de conteúdos, “odres velhos”, etc., são algumas das muitas floreações desnecessárias que ele coloca no texto.

Mas isto é menos mal do que alguns erros ou vícios contra a língua, na edição textual. Digo alguns erros como por exemplo “Indeed, Bibby did indeed find that Canadians are”. Entretanto, a maior carência de edição ocorre com o uso insistente que Park faz de um clichê: “both of...” Numa monografia de 46 páginas, com um texto de 39 páginas, ele usa esta expressão, 53 vezes! Sendo que, na maioria das vezes, bastaria deletá-la da frase, e ela não faria nenhuma falta ao entendimento do texto.

Mas vamos ao que o texto tem de bom. Vou apresentar-lhe um resumo da monografia já mesclado com meus comentários e explicações.

James H. Park é professor associado de discipulado e missão. Foi um católico devoto até seus 20 anos, aproximadamente, quando se converteu à IASD. De 1978 a 2003, atuou como pastor na Southern California Conference. A partir de 2003 até o presente, ensina no AIIAS Theological Seminary. Fez mestrado em divindade na Andrews University e doutorado e Ph.D em missiologia no Fuller Theological Seminary.


De acordo com James Park, “Mateus forneceu aos discípulos missionários um compêndio maravilhoso... o qual os discípulos poderiam usar enquanto prosseguissem obedecendo a Grande Comissão”. Ou seja, “o livro de Mateus… poderia ser um manual de discipulado”. Mas, ele explica que, “procurando reforçar os fundamentos bíblicos e teológicos de discipulado”, ele passa então a uma pesquisa em Lucas e Atos. Para ele, “Lucas 4:16-21 substituiu a Grande Comissão”, porque, “mais do que qualquer autor do NT, Luca fala do Espírito de Deus”.

Desta perspectiva bíblica, Parker propõe-se a olhar para os contexto do modernismo e do pós-modernismo “com o objetivo específico de descobrir as dinâmicas que têm impedido ou ajudado o processo do discipulado”. Na primeira parte, ele tenta apresentar um entendimento “da igreja do NT através das disciplinas Sociologia e Antropologia Urbana.

Ele começa mostrando um panorama do mundo do primeiro século e como “uma comunidade inclusiva e íntima de crentes foi capaz de testemunhar ministrar para a realidade urbana tão diversificada e condensada da qual ela cresceu”. Para Parker, embora nos dias de Paulo a maioria das pessoas vivessem na zona rural, o cristianismo, mesmo daquela época, foi um movimento essencialmente urbano.  Uma das razões tenha provavelmente sido porque, embora as cidades não fossem grandes como hoje, elas possuíam duas características importantes para a difusão de uma nova ideologia: a) A mistura intensa de pessoas em trânsito ou paragem de curta duração oriundas dos mais diferentes lugares; b) A rede de estradas que, ligando tais cidades, proporcionava esta rotatividade. “Onde a maior parte da população é de recém-chegados ou de pessoas que mudam-se de um canto para outro, o número de pessoas que participam de atividades religiosas não-convencionais é alto”. Ou seja, o caráter rotativo e instável da população do império romano do primeiro século permitiu-lhe, como característica social, a abertura para receber o cristianismo. Logo, a instabilidade contemporânea é a oportunidade dos interesses evangelísticos do cristianismo.

 A cristandade cresceu fora do pluralismo popular, “e não entre as classes mais marginalizadas de pessoas” em um tipo de comunidade que gozava de uma intimidade muito dada e familiar. “Os grupos cristãos eram muito mais abrangentes em termos de estratificação social”, pois, na essência do cristianismo, “abraçar o evangelho, então, é entrar na comunidade”. A igreja não era uma estrutura de construção, mas sim, uma reunião de pessoas, geralmente em pequenos grupos. O senso de pertencer a uma comunidade ao mesmo tempo local e universal era mui fortemente alimentado pela metodologia apostólica de pastoreio da igreja.
“De acordo com Adlof Von Harnak, foi o forte intercâmbio (interação) social entre as pessoas, e não algum evangelista, que provou ser o missionário mais efetivo”. Ambiente adequado para “a comunidade testemunha”. Então, de acordo com Rodney Stark, conversão não é o abraço a uma nova ideologia ou comportamento religiosos, mas sim a novas pessoas: amigos, irmãos e Mestre piedosos. O cristianismo daquela época foi um suprimento certo para o tipo de gente daquela época. E as nossas cidades, estão cheias de que tipo de gente? É isso que precisamos saber para sabermos o que oferecer.

O candidato à confissão cristã não deverá estranhar propostas de sacrifício, uma vez que o próprio cristianismo normatiza-se sacrificalmente.

Mas através dos tempos as coisas mudaram. O modernismo influenciou todas as areas da vida, e tal mudança aconteceu, também, no discipulado cristão. Com a “conversão de Constantino, o cristianismo migraria da periferia para o centro da sociedade.

É aí, já nestes remotos ermos, que começam a aparecer os fundamentos do Iluminismo. A igreja sincretisou sua pura doutrina, bebendo das fontes da filosofia grega e ajustando-se ao governo romano. Foi um tipo de pluralismo onde a igreja ousou usar o poder secular. Surgiu aí a aliança estado/igreja. O autor aponta Newbigin e Graf Reventlow que, falando acerca dos fundamentos do Iluminismo, dizem que o modernismo não vem do surgimento da Ciência, mas sim de um interesse classicista Greco-Romano anterior de tradição humanista com raízes fincadas no Renascimento e na Reforma, desembocando-se tudo no Iluminismo.
E o que isso teria então a ver com a modernidade, ou com o modernismo? O sucesso da Ciência e o erguimento dos estados independentes fizeram que o humanismo suplantasse o cristianismo na fileira autoritativa da cultura. Mas isto não envolveu a intolerância entre a fé cristã e a Ciência, porque foi a própria “Reforma que colocou a entronização da razão em conflito com a fé. A avaliação negativa que a Igreja fez dos ideais do Iluminismo” fez emergir o indivíduo livre e autônomo. Então, o Iluminismo encarregou-se de polarizar o que antes era amalgamado: igreja e estado, fé e razão, passado e presente, grupo e indivíduo.
Isto porque, no conceito dos pensadores, a religião não estaria mais explicando o mundo, e então deveria ser regulamentada para um espaço puramente privado que não teria função real no mundo. “Assim, o bravo novo mundo da modernidade foi criado... A humanidade deveria ser salva não pelo evangelho, mas pelo estável avanço da ciência”. Ciência passou a significar verdade.

É aí que entra o crescimento do individualismo, principalmente, nos termos americanos. O Iluminismo já providenciara os fundamentos do individualismo. “Então, a América seria então a mais importante no fornecimento do contexto geográfico. A religião civil da América não é baseada na Bíblia, mas é construída sobre um tipo de auto-suficiência jefersoniana. Valor é sempre algo avaliado em relação com outra coisa”. Relativismo puro. E é por isso que o individualista relativisa tudo.

E isto tudo vem parar, também e inclusive, na igreja. Parker explica que hoje em dia quem está indo à igreja é um tipo de gente que vive “juntos porém, sozinhos”. Muitos destes são membros de PGs, geralmente, gente que já era crente e estava apenas afastada. Parker diz que isso não é evangelismo, mas sim reciclagem.

E diante disso vem a grande pergunta: “Os pequenos grupos podem contra combater o indivitualismo?” Talvez sim, mas talvez não, por que o incrível é que a nossa própria forma de "fazer" religião promove o individualismo que a assassina. Portanto, para responder a isto, um primeiro passo é este da análise sobre quem são as pessoas que preferem freqüentar a um PG. De acordo com o autor, são as mulheres, os que têm faculdade, as pessoas entre 35 e 49 anos, depois os bem idosos, os de baixa renda. Por um lado, estas pessoas estando ali nos PGs, estes exercerão sobre elas uma força que quererá movê-los para longe de uma religião somente privativa e individualista. Por outro lado, eles estão ali justamente porque querem, ali, buscarem se reforçar, como indivíduos, em sua religiosidade.

Logo, para o autor, uma das saídas é praticar as disciplinas espirituais nos pequenos grupos. Este pesquisador verificou que embora diga-se que nos PGs estuda-se a Bíblia, as pessoas que freqüentam PGs não conhecem a Bíblia mais do que as outras, porque o que tem sido feito ali é alegórico e superficial. E as pessoas gostariam que a prática do estudo da Bíblia em PGs fosse mais sistemática e profunda. Sobre a disciplina espiritual da oração, vale notar que o PG oferece a diferencial oportunidade de fazer-se os pedidos, lembrar-se de orar pelos mesmos, e depois poder-se testemunhar sobre como tais orações foram respondidas. Isto ajuda a busca por uma fé que não apoiar-se-ia somente em sentimentos, mas que teria realmente coragem para subsistir às provas. Uma disciplina espiritual para PGs importantíssima é o suporte aos irmãos. Primeiro os membros de um PG precisam aprender serem suporte uns aos outros; então tal PG conseguirá ser assistencial à comunidade.

“Uma tolerância de visões divergentes só pode ter sucesso se todas as partes concordarem com uma visão pluralística”. Se a tolerância religiosa é a concepção do pluralismo, até onde deve ir nosso aplauso à mesma? Este paradoxo reivindica a necessidade da igreja posicionar-se em suplicar por uma ajuda superior. Se lutamos pela libertade religiosa, alimentamos o pluralismo; se não, alimentamos a intolerância. Está aí a razão pela qual a igreja deve lutar (clamar) pelo reavivamento, pela reforma e pela Chuva Serôdia.

A aparente tolerância mútua em uma sociedade pluralista não representa a aceitação dos empáticos, mas sim a indiferença dos egocêntricos. “Uma recente amostra do Instituto Gallup apontou que existe um dramático crescimento de fome espiritual na América, tendo crescido de 58 para 82 por cento nos últimos anos”. Isto mostra como o pós-modernismo é mais aberto à religiosidade do que o modernismo.

O apelo do autor é que “não poderia haver textos melhores do que aqueles encontrados no Apocalipse”, quando João apela a nós, chamados nos últimos tempos, a vivermos “o retorno ao primeiro amor, não se contentando mais com a doutrina doentia, os relacionamentos mornos ou com uma missão bitolada”. Aquele que tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas (Apocalipse  3:22).

Twitter: @Valdeci_Junior



Informação Bibliográfica: James H. Park, “Urban Disciples Then and Now” A Tutorial for the Ph.D. Degree in the School of World Mission of the Fuller Theological Seminary to Dr. Wilbert R. Shenk. 46 páginas.


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