Introdução
Acabo de ler um artigo acadêmico da área teológica que quero
compartilhar com você. O trabalho "Secularization and the City: Christian
Witness in Scular Urban" é, na realidade, o quinto capítulo de Discipling
The City (Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1992, páginas 69 a 83),
um livro editado por Roger Greenway, contendo vários autores. Neste quinto
capítulo, Craig Van Gelder faz uma análise do interrelacionamento entre a
urbanização, a industrialização e a secularização no Ocidente.
Craig Van Gelder
Gelder foi ordenado como pastor na Igreja Presbiteriana dos
EUA em 1984 e na Igreja Cristã Reformada em 1990.
Depois de ter conquistado um bacharelado de artes da
Universidade Estadual da Geórgia em 1970, Van Gelder recebeu o mestrado em
divindade da Reformed Theological Seminary, em Jackson, MS, em 1978. Ele fez um
Ph.D. em missões na Southwestern Baptist Theological Seminary, em Fort Worth,
Texas, em 1982, e um doutorado em Administração de Assuntos Urbanos da
Universidade do Texas em Arlington, em 1985.
É autor do
livro The Essence of the Church: A Community Created by the Spirit (2000),
editor de Confident Witness-Changing World: Rediscovering the Gospel in North
America (1999), co-autor de Missional Church: A Vision for the Sending of the
Church in North America (1988), e co-editor de The Church Between Gospel and
Culture: The Emerging Mission in North America (1996).
Gelder é professor de missão congregacional no Luther
Seminary em St. Paul, MN, tendo ensinado desde 1998, por 10 anos, como
professor de missiologia doméstica no Calvin Theological Seminary in Grand
Rapids, MI. Ele é membro da Sociedade Americana de Missiologia, da Scientific
Study of Religion, e da Urban Affairs Association.
A Secularização e a Cidade
A análise que Gelder faz no artigo é construída num olhar cronológico que tenta
enxergar e expor o pensamento ocidental deste o Iluminismo até o pós-modernismo.
Dela, é possível ao leitor retirar definições, diretas e ao ponto, dos termos
secularização, secularismo, iluminismo, racionalismo, empirismo, modernismo,
pluralismo, relativismo e pós-modernismo.
Além disso, tal artigo a) permite identificar os principais
valores do iluminismo e como tais moldaram a sociedade moderna ocidental; b)
descreve os efeitos da secularização sobre as crenças e costumes sociais e como
as igrejas têm reagido a isto; c) mostra que efeitos uma cosmovisão relativista
parece ter sobre as convicções cristãs, os comprometimentos denominacionais e
os padrões éticos; d) faz entender quais são alguns dos fundamentos que os
discípulos de Cristo precisam agarrar (e quais são as fontes destes
fundamentos) em um mundo pós-moderno; e e) descreve sobre como a tarefa global
de fazer discípulos no mundo pós-moderno pode ser vista.
Resumo do Conteúdo
Abaixo, apresento um breve resumo da explanação de Craig Van
Gelder, sobre isto que acabo de relatar. Tudo o que está entre aspas e em
itálico são palavras do próprio autor, apenas sob minha tradução para o
português.
“Secularização é um processo de mudanças na
ordem social que ocorre quando novas tecnologias ou modos de produção são
implementados”. “Este processo ganho seu maior ímpeto na cultura ocidental
durante o Iluminismo...” “um salto das cosmovisões medieval e cristã, focadas
em Deus e na revelação para uma cosmovisão focada no mundo imediato como a
última realidade e no indivíduo como o centro da autoridade...” “associada com
o secularismo, uma filosofia hostil às crenças espirituais e explanações
sobrenaturais dos eventos e da história”.
“Uma
das mais interessantes características desta nova cosmovisão [pós-modernismo]
é que ela mantêm o modelo econômico
enraizado na tecnologia baseada na ciência intacto enquanto reintroduz (ou
permite) elementos do sobrenatural e do espiritual”.
O Confronto à Pobreza Começa Com a Educação
“Uma
maneira de resolver este problema é os professores e líderes de igrejas se
tornarem envolvidos pessoalmente com os pobres e com os ministérios voltados
para eles. Se cada líder cristão se tornasse pessoalmente envolvido com pelo
menos uma pessoa pobre e envolvido em um ministério urbano entre os pobres, as
coisas começariam a mudar nas nossas igrejas e escolas. O ensino e a pregação
seriam diferentes. Petições nas quais nunca pensamos antes, seriam adicionadas
às nossas orações. Nenhuma igreja ou escola seriam a mesma depois que seus
líderes se tornassem pessoas envolvidas com os pobres. E a vida nas favelas
mudaria também”.
“Quando
pastores e professores engajam no ministério voltado aos pobres, estudantes e
membros da igreja fazem o mesmo. A membresia costuma fazer o que vê os seus
líderes apoiando que seja feito. Mas quando os líderes mostram o caminho e o
modelo da genuína compaixão em suas próprias vidas e ministérios, a onda pega
nas instituições. A pregação e a instrução passam a ter nova credibilidade e
ministérios que nunca haviam sido tentados antes podem ser introduzidos”.
Sobre “o
erguimento do Pós-Modernismo e da cultura baseada no iluminismo” sobre os
quais “Karl Marx e outros advertiram”
acerca dos “preços a pagar”, baseado
em “Max Weber, um sociólogo alemão...”
no “sociólogo Emile Durkheim”, em “Dietrich Bonhoeffer”, nos filósofos “Kant, Hegel e Kierkegaard”, e em vários outros grandes escritores, Gelder
explana sobre “a disseminação do projeto
moderno e as respostas para os seus efeitos”: “A consciência crescente de que a secularização foi uma bênção e uma
maldição começou a permear toda a literatura tanto do movimento de missões
quanto do crescente movimento ecumênico”. “Esta acomodação passou por uma série
de desenvolvimentos teológicos ao longo do tempo, incluindo o movimento do
evangelho social, o liberalismo clássico, a neo-ortodoxia e o existencialismo”.
Mudanças no Projeto Moderno e Seus Principais Pressupostos no Ocidente
“Durante
a década de 1960...[houve] a necessidade de as igrejas tornarem-se seculares em benefício do
mundo”. Este movimento reformulou “a
cosmovisão cristã” e “alcançou seu pico
com os teólogos da ‘morte de Deus’”. Uma “ultra secularidade” eliminou “a
influência cristã” e concebeu o “pluralismo”.
A Disseminação do Projeto Moderno no Mundo e Sua Influência
“Apareceram
dois padrões comuns nas partes do Terceiro Mundo e do Mundo em Desenvolvimento
que aceitaram as mudanças modernistas e a secularização”. No primeiro caso,
“um grupo minoritário apropriou-se dos
benefícios da infusão do capital e da tecnologia ocidentais, enquanto a vasta
maioria continuou a viver dependente da agricultura e em extrema pobreza”. No
outro caso, “muitas nações lançaram
processos de expansão econômica e de urbanização que levaram ao deslocamento em
massa dos grandes setores de suas populações a partir de seus padrões de vida
tradicionais”. Este foi o caso, por exemplo, do nosso Brasil.
“Durante os
últimos trinta anos [décadas de 1960, 70 e 80], a secularização, em face da modernização, tem golpeado muitas das
nações subdesenvolvidas e em desenvolvimento com uma vingança”, destruindo
todos os seus sistemas tradicionais de cultura. Uns poucos, como o Japão e a Índia, ficaram bem posicionados para incorporar a economia e a tecnologia
modernistas sem deixar que seus sistemas tradicionais de crenças fossem
deslocados”. Por isto, as missões aqui têm distintos alvos e desafios.
“O
massivo crescimento dos centros urbanos nos países que não do primeiro mundo
são uma conseqüência da introdução do modernismo, mas não estão ligados
diretamente ao desenvolvimento”. Conseqüentemente, acontece “a ruptura da tradição, o rompimento da comunidade, a fragmentação
da família”... e o “a necessidade de
viver em extrema pobreza”.
O Colapso do Modernismo: Um Mundo Pós-Moderno
“Enquanto
verdades empíricas podiam ser mantidas baseadas em "fatos" observáveis,
ficava claro que nenhum campo unificado de conhecimento poderia ser construído
sem incluir a consideração dos "valores".
Era “o colapso do fundamentalismo”...
“Da filosofia, a consciência se espalhou
pelas outras artes, como a pintura [impressionistas e expressionistas]..., a música, a literatura, o teatro”,
onde “líderes em cada disciplina
desistiam de tentar descobrir a essência ou os princípios essenciais que se
supunham para pressupor e guiar seus trabalhos”.
“A
mudança, nessa transição, foi de uma cosmovisão que procurava definir um todo
racional para tudo na vida para uma visão de mundo que aceitava a condição
humana como relativa para qualquer reivindicação da verdade em qualquer
contingente, situação ou circunstância”. “Um mundo relativista... nas ciências físicas [física quântica,
teoria da relatividade, princípio da incerteza] e sociais [psicologia Freudiana e sociologia Weberiana], “A própria ciência... estava
experimentando uma mudança de cosmovisão”... bem como a “cultura mais ampla e os sistemas econômicos
e políticos”.
A secularização passou por duas fases e agora
estamos na terceira. “Não estamos mais
nos poderes do músculo ou da máquina, mas sim na expansão e manipulação da
informação para gerenciar nossas vidas. Isto representa a terceira fase da
secularização no mundo Ocidental, uma
fase caracterizada pelo poder da informação”... “Nós agora vivemos num mundo de miniaturização, diferenciação e
individualização sem fim”... “Mudança
e fluxo... em lugar de substância e princípio”.
Resumo
Conclusivo
“Seja
qual for a nomenclatura, a nova realidade agora torna-se clara. Nós ainda temos
os processos básicos da economia modernista por aí, junto com as tecnologias
que dirigem seu desenvolvimento, mas nós temos perdido as principais suposições
do iluminismo (ordem racional, progresso histórico e gerenciamento da vida) que
fundaram sua identidade, e nós temos também visto a diminuição da viabilidade
das instituições centrais (estado-nação, capitalismo e burocracia) que moldaram
seu desenvolvimento. Isto significa que a secularização ainda é uma realidade, mas tem
assumido uma nova face na aldeia global; uma face pós-moderna com ênfases no
fluxo, nas superfícies, nas imagens, e, no presente momento, em tudo que opera
em comum aceitação do pluralismo e do relativismo”...
Esta
cosmovisão pós-moderna, com sua nova face de secularidade, reintroduziu um
elemento que o modernismo tinha perdido: a espiritualidade e o sobrenatural. Restam
dois desafios para a igreja: apresentar a verdade como verdadeira para quem não
entende que exista que a verdade exista e apresentar a verdade como única para
os que são pluralistas.
Análise Crítica Conclusiva
Deste material, poderei tirar ótimas referências de apoio
para uma parte na minha dissertação onde pretendo apresentar as mudanças de
pensamento ao longo do século. Nesta apresentação, faço um paralelismo entre o
pensamento filosófico e o puritano, chegando aos nossos dias numa comparação
que termina apresentando o neopentecostal como pós-moderno. Este capítulo de Gelder
é um apoio que ajuda a responder, ou justificar, a razão de o neopentecostal
ser pós-moderno.
Um ponto positivo do pós-modernismo é o seu lado “religioso”
de aceitação à espiritualidade e sobrenaturalidade, pois isso abre uma
oportunidade evangelística. E este é o vácuo no qual o cristianismo deve pegar
ar. Na dissertação que estou construindo, também apresento a mudança da
cosmovisão do mundo científico, o que também já era concebido por Craig Van
Gelder.
Mas a novidade para mim foi conseguir enxergar, pelas lentes
de Gelder, de forma mais límpida, uma diferenciação entre a secularização e o
secularismo. Por elas, pude perceber que a secularização seria uma ótima
oportunidade para a edificação e o crescimento do cristianismo. O problema foi
a introdução da doença chamada secularismo, que meteu, na secularização, uma
nova face.
Por um lado, é uma pena que este artigo tenha sido escrito
há vinte anos. O que nele é apresentado como “hoje” é obsoleto e carente de
reanálise. Por outro lado, é incrível ver como um autor, no milênio passado,
falava como se estivesse falando em plena segunda década do século vinte e um.
Penso que o que ele mudaria hoje, seria sua postura em exaltar demais os
supostos valores do iluminismo, características estas que eram muito falhas
também.
Um abraço,
Twitter: @Valdeci_Junior
Informação Bibliográfica: Craig Van Gelder, “Secularization and the City:
Christian Witness in Scular Urban” – Disciplin The Church, editado por Roger S.
Greenway, 2ªa ed., Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1992, páginas 69 a
83.
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